O art. 31 da Lei nº 8.212/91 já foi alterado pelo menos quatro vezes desde sua promulgação (pelas Leis nºs 9.258/97, 9.711/98, 11.488/2007 e 11.933/2009), mas parece que até hoje a União não conseguiu do Congresso Nacional uma redação que lhe satisfaça os apetites. Isto, porém, não lhe tem tolhido a busca por mais receita previdenciária. Como alguém acostumado a fazer justiça com as próprias mãos, a União demonstra, na regulamentação deste dispositivo, que resolve o problema empurrando os limites sempre um pouco pra diante. Criativamente.
Estamos falando do dispositivo legal que obriga a empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão de obra a reter 11% do valor bruto da nota fiscal em nome da prestadora dos serviços, como antecipação da contribuição previdenciária patronal incidente sobre a remuneração dos empregados cedidos. Depois de analisar a questão, concluímos que o que mais impressiona é o acinte com que a União burla os limites impostos pelo art. 99 do Código Tributário Nacional (CTN), ampliando a seu gosto o alcance do dispositivo e transformando em presas fáceis do fisco inúmeros contribuintes que não têm absolutamente nada a ver com a obrigação de reter ou sofrer a retenção. Com este expediente, antecipa sua receita de modo inapelavelmente ilegal e expõe contribuintes que não têm nada a ver com o dispositivo a serem autuados segundo critérios altamente subjetivos dos auditores fiscais. O art. 99 do CTN, contrariamente ao que se vê, exige que o Poder Executivo, ao regulamentar dispositivo de lei, contenha-se nos limites objetivos estabelecidos pelo legislador.
Um conceito essencialmente importante para determinar quando é que a prestação de serviços deve ser objeto de retenção dos 11% é saber o que é prestação de serviços com cessão de mão de obra, e tão importante quanto isto, é descobrir qual é sua característica mais importante e diferenciadora. O legislador, sabendo desta importância, foi além do que deveria e interpretou a própria lei que urdiu no Congresso Nacional, acrescentando-lhe uma explicação que faz toda a diferença, e que desnuda de modo evidente o desvio que tem acontecido.
O congressista estabeleceu em lei que ceder mão de obra não é apenas enviar seus empregados ao estabelecimento do tomador, é fazer isso deixando-os à disposição dele. Deixar trabalhadores à disposição do tomador de serviços é, segundo a única característica que une todos os exemplos que deu na própria lei, expô-los ao poder diretivo e disciplinador deste; é ceder, temporária e contratualmente, seu poder de mando. Esta compreensão é essencial.
Para que não houvesse dúvidas acerca desta característica da cessão de mão de obra a que se referia, o legislador deu até exemplos, e é analisando os exemplos é que se chega à conclusão aqui exposta: a contratação de mão de obra no regime da Lei nº 6.019, por exemplo (citado no inciso IV do § 4º do art. 31) é típica prestação de serviços com cessão de mão de obra cujo pagamento deve sofrer a retenção dos 11%. E o é porque o cedente manda para o tomador de serviços um segurado para que cumpra em seu estabelecimento, ou no de terceiro, as funções que o seu empregado é que deveria cumprir. Lá, este trabalhador cedido passa a receber ordens do tomador de serviços, como se empregado dele fosse. Isto, não outra coisa, é que é pôr à disposição do tomador a mão de obra contratada.
Os outros três exemplos adicionados à lei vão na mesma direção: limpeza, conservação e zeladoria; vigilância e segurança; e empreitada de mão de obra (incisos I, II e III do § 4º do art. 31). Na empreitada de mão de obra, aliás, esta característica é ainda mais visível: diferentemente da empreitada em que se visa o trabalho finalizado, que pode ser objeto de contrato fechado e ser cumprido pelos trabalhadores empregados do prestador sem interferência direta do tomador, na empreitada de mão de obra o tomador contrata mão de obra por determinadas horas ou dias para, segundo seus próprios critérios, comandar ora a substituição de um piso, ora a reforma de um quadro elétrico, ora a substituição de um encanamento, ora a construção de um muro, ora o desentupimento do esgoto etc., tudo aleatoriamente, no ritmo que bem entender, desde que todos os serviços caibam dentro do período contratado.
A forma com que a União regulamentou o dispositivo, porém, desnuda que sua real intenção não era e nem é conter-se nos limites da lei, é apenas usá-la como base para exigir em que circunstâncias quer, de fato, que haja a retenção dos 11%. Hoje, não existe mais, é forçoso dizer, retenção de contribuição previdenciária nas prestações de serviços com cessão de mão de obra, mas retenção nos casos listados na IN MPS-SRP nº 3, de 14/07/2005.
E nesta instrução normativa, vê-se facilmente, não consta nenhum indício de que a lista de serviços que veicula contém apenas os que são prestados com cessão de mão de obra. Sabe-se à larga que os auditores fiscais exigem comprovação de retenção em todos os serviços ali listados, independentemente da modalidade (que nem é pesquisada, aliás) da contratação.
Convenhamos, para exigir a retenção nos moldes como vem fazendo, o que diz o art. 31 da Lei nº 8.212/91 não interessa à União, é como se o dispositivo sequer existisse. Mais uma vez, o contribuinte vem sendo obrigado a submeter-se não ao que diz a lei, mas ao que dizem atos normativos que mudam ao sabor das conveniências do poder de plantão. Trata-se de abuso que encontra solução apenas na via judicial, e socorrerá apenas os contribuintes que tomarem a iniciativa de discutir a questão.
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