Depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) finalmente pôs termo à tentativa da União de inovar no conceito de “faturamento” por meio da Lei nº 9.718/98, que declarou inconstitucional por ter entrado em vigor antes da EC nº 20/98, editada especialmente para que pudesse valer, abriram-se horizontes distintos para os sujeitos passivos destas duas contribuições que discutem em juízo a majoração de suas bases de cálculo.
O fato profundamente interessante a respeito desta decisão, porém, é que o contribuinte médio, aquele que vem formando sua convicção a respeito do que deve ou não deve pagar de contribuições sociais a partir das últimas decisões dos tribunais superiores – e também, claro, a partir da interpretação correta e constitucionalmente defensável da legislação federal atinente a estas contribuições -, é que ele parece não ter compreendido totalmente o alcance das enormes possibilidades que se abriram a partir daí.
Quem foi beneficiado com a decisão do STF e hoje recolhe estas contribuições no regime cumulativo, ou seja, no regime pré-existente de Pis e de Cofins, volta a calculá-las conforme foram instituídas, ou seja, pela Lei Complementar (LC) nº 7/70, para o Pis, e pela LC 70/91, para a Cofins, e têm direito de compensar o que recolheram a mais de ambas as contribuições (com a base de cálculo inconstitucionalmente majorada, segundo a decisão do STF) desde fevereiro de 1999.
Isto quer dizer que, para estes contribuintes, estão fora das bases de cálculo destas contribuições todos os valores oriundos de atividades outras que não “vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços ou de serviço”. Exemplificadamente, deixaram de constar na base destas contribuições a receita de locação de bens próprios e a de venda de bens imóveis (que não são nem receitas oriundas de vendas de mercadorias nem de prestação de serviços). Esta é a parte óbvia da decisão do STF.
Os contribuintes destas contribuições que hoje se regem pelo sistema não-cumulativo também terão direito de compensar o que recolheram a mais de Pis e Cofins desde fevereiro de 1999 – desde que, obviamente, sejam beneficiadas pela decisão judicial.
Esta faceta mais óbvia, direta, clarificada a partir da decisão, porém, não é a única. Não é a mais evidente, nem a mais benéfica, nem necessariamente a mais interessante em termos de economia tributária. Convidamos o contribuinte a continuar a ler este artigo e a compreender conosco os desdobramentos da decisão do STF.
A partir de janeiro de 2003, mesmo que tenham sido beneficiados pela decisão do STF, os contribuintes de Pis não-cumulativo apuram-no com a base de cálculo (e alíquota) majorada, pois a Lei nº 10.637/2002, posterior à Lei nº 9.718/98, instituiu não só seu novo regime de apuração como também repetiu a inovação da base de cálculo que havia naquela lei cujo dispositivo foi declarado inconstitucional, só que agora validamente, pois após a EC nº 20/98.
A partir de janeiro de 2004 também a Cofins tem a base de cálculo (e alíquota) majorada, pelos mesmos motivos: a Lei nº 10.833/2003 que transformou os sujeitos passivos da Cofins cumulativa em não-cumulativa tornou-os sujeitos ao novo conceito de base de cálculo. Na prática, ambas as leis instituíram novas contribuições sociais – e de fato elas são totalmente novas, em todos os aspectdos – com os mesmos nomes das que existiam antes.
O art. 2º da Lei nº 10.637/2002 determina que, sobre a base de cálculo assim determinada, deve ser aplicada alíquota de 1,65% (em vez da alíquota de 0,65%) antes de se subtraírem os créditos tratados nos dispositivos seguintes da lei. Por sua vez, também a Lei nº 10.833/2003 se refere de forma muito clara à base da Cofins não-cumulativa, ampliando-a.
Sobre a base de cálculo assim definida, o art. 2º da Lei nº 10.833/2003 manda que seja aplicada a alíquota de 7,6% (antes 3%) antes de se subtraírem os créditos concedidos.
Ocorre, porém, que há uma série de exceções nas próprias leis; exceções para os quais o legislador manda aplicar alíquotas diferentes. Todo contribuinte sujeito a regime tributário específico existente antes das leis que instituíram a não cumulatividade (operadores de combustíveis, medicamentos, pneumáticos etc.) devem aplicar as alíquotas de seus regimes próprios; os que comerciam com contribuintes estabelecidos na ZFM também têm alíquotas diferenciadas, e assim por diante.
Especial atenção, ainda, deve ser dada aos contribuintes que, independentemente de hoje questionarem judicialmente a majoração da base de cálculo de Pis e de Cofins operada pela Lei nº 9.718/98, ainda se encontram no regime cumulativo destas contribuintes por não terem sido atingidos pelas Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, e que também são muitos.
Além destes, muitos contribuintes que estão no regime não-cumulativo têm expressiva parte de suas receitas – quando não todas, em algumas situações – sujeitas à alíquota antiga, de 3%. Estes contribuintes devem entrar o quanto com ações judiciais pleiteando a volta do cálculo destas contribuições tal como determinam as LC nº 7/70 e 70/91 e o creditamento dos valores pagos a mais nos últimos 5 anos, e são os seguintes, segregados por vários critérios diferentes, vejamos:
De Pis, segundo o art. 8º da Lei nº 10.637/2002, misturam-se exclusões feitas por vários critérios totalmente distintos uns dos outros. Estão fora do regime cumulativo de Pis, por exemplo, (e que devem valer-se de base de cálculo antiga e também alíquota anterior) contribuintes considerados (1) pela atividade econômica exercida (como vários tipos de bancos), (2) pelo regime de apuração do IR (quem apura no lucro real está no regime cumulativo, os demais no não-cumulativo), (3) pelo regime fiscal por que optou (regime do Simples é cumulativo), (4) pelo modo de constituição da personalidade jurídica (cooperativas estão no cumulativo), (5) pela imunidade fiscal (imune não está no não-cumulativo), (6) por ser de direito público ou privado (as direito público e as educacionais estão no cumulativo), (7) por alguns tipos de receita apurada (as decorrentes de venda de álcool carburante, ou de serviços de telecomunicações, dentre outras, são do cumulativo) etc.
De Cofins, excepcionados pelo art. 10 da Lei nº 10.833/2003, repetem-se todos os já referidos na Lei nº 10.637/2002, pelos mesmos critérios (ou “mistura de critérios”), a que foram acrescidos muitos outros a partir do inciso XII do art. 10, e são:
Art. 10. Permanecem sujeitas às normas da legislação da COFINS, vigentes anteriormente a esta Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1o a 8o:
(…)
XIII – as receitas decorrentes de serviços:
a) prestados por hospital, pronto-socorro, clínica médica, odontológica, de fisioterapia e de fonoaudiologia, e laboratório de anatomia patológica, citológica ou de análises clínicas; e
b) de diálise, raios X, radiodiagnóstico e radioterapia, quimioterapia e de banco de sangue;
XIV – as receitas decorrentes de prestação de serviços de educação infantil, ensinos fundamental e médio e educação superior.
XV – as receitas decorrentes de vendas de mercadorias realizadas pelas pessoas jurídicas referidas no art. 15 do CL nº 1.455, de 07/04/1976;
XVI – as receitas decorrentes de prestação de serviço de transporte coletivo de passageiros, efetuado por empresas regulares de linhas aéreas domésticas, e as decorrentes da prestação de serviço de transporte de pessoas por empresas de táxi aéreo;
XVII – as receitas auferidas por pessoas jurídicas, decorrentes da edição de periódicos e de informações neles contidas, que sejam relativas aos assinantes dos serviços públicos de telefonia;
XVIII – as receitas decorrentes de prestação de serviços com aeronaves de uso agrícola inscritas no Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB);
XIX – as receitas decorrentes de prestação de serviços das empresas de call center, telemarketing, telecobrança e de teleatendimento em geral;
XX – as receitas decorrentes da execução por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, até 31 de dezembro de 2006;
XXI – as receitas auferidas por parques temáticos, e as decorrentes de serviços de hotelaria e de organização de feiras e eventos, conforme definido em ato conjunto dos Ministérios da Fazenda e do Turismo.
XXII – as receitas decorrentes da prestação de serviços postais e telegráficos prestados pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos;
XXIII – as receitas decorrentes de prestação de serviços públicos de concessionárias operadoras de rodovias;
XXIV – as receitas decorrentes da prestação de serviços das agências de viagem e de viagens e turismo.
XXV – as receitas auferidas por empresas de serviços de informática, decorrentes das atividades de desenvolvimento de software e o seu licenciamento ou cessão de direito de uso, bem como de análise, programação, instalação, configuração, assessoria, consultoria, suporte técnico e manutenção ou atualização de software, compreendidas ainda como softwares as páginas eletrônicas.
XXVI – as receitas relativas às atividades de revenda de imóveis, desmembramento ou loteamento de terrenos, incorporação imobiliária e construção de prédio destinado à venda, quando decorrentes de contratos de longo prazo firmados antes de 31 de outubro de 2003;
§ 1o Ficam convalidados os recolhimentos efetuados de acordo com a atual redação do inciso IX deste artigo.
§ 2o O disposto no inciso XXV do caput deste artigo não alcança a comercialização, licenciamento ou cessão de direito de uso de software importado.
A grande diversidade de critérios adotados pelo legislador em ambos os casos – o que demonstra que a União está “raspando o osso” em se tratando de legislação tributária, legislando para cada caso concreto tendo em vista a máxima obtenção de receita e tornando cada vez mais complexo o ordenamento jurídico-tributário nacional – demonstra que é muito interessante estudar todas as possibilidades de planejamento tributário.
Os contribuintes optantes pelo Simples, por exemplo, podem obter significativa redução de Pis e de Cofins caso a receita financeira obtida por eles seja significativa.
A criteriosa análise de todas as exceções que foram abertas na Lei nº 10.637/2002 e na Lei nº 10.833/2003 pode trazer significativa economia mesmo para os contribuintes que tiveram a base de cálculo redefinida por estas leis e estão no regime não-cumulativo, porque dentre as exceções previstas estão as que privilegiam receitas específicas, remetendo contribuintes à alíquota do regime anterior – isto significa recolher menos da metade de Cofins em alguns casos (3% em vez de 7,6%) e cerca de um terço de Pis (0,65% em vez de 1,65%).
Você, contribuinte, independentemente do regime de contribuição de Pis e de Cofins a que está sujeito – regime especial, cumulativo ou não cumulativo, esteja ou não beneficiado por decisão judicial transitada em julgado – tem todo o direito de verificar se, de fato, a carga tributária a que está sujeito hoje destas contribuições é mesmo a devida.
Convidamos você a agendar e fazer conosco uma verificação atenta e criteriosa de sua situação. As surpresas prometem ser grandes.
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