Entra ano, sai ano, de certo por parte do governo federal o brasileiro só vê movimentos em direção ao aumento da receita. O agressor da vez é a Previdência Social, e a principal vítima é o empregador, especialmente neste momento difícil por que passa a economia como um todo. Perdido entre 14 outros decretos datados de 12/01/2009 e publicados no dia seguinte, está o de nº 6.727, por meio do qual o Presidente da República revogou a alínea “f” do inciso V do § 9º do art. 214 do Decreto nº 3.048/99.
Esta sopa de letras significa, em bom português, que o governo federal alterou o RPS (Regulamento da Previdência Social) para aumentar a arrecadação previdenciária exigindo contribuição sobre aviso prévio indenizado. Ambos os lados desembolsarão mais do que o devido; o empregado, à alíquota que varia entre 8% a 11%, e a empresa, nos obscenos 20% que cabe aos empregadores.
A nota trágica do episódio cabe a fontes oficiais, que, alegando que o ajuste “nada a ver com o clima atual”, teria sido feito para “harmonizar e legislação previdenciária com a tributária” e “corrigir um problema”, garantem que está em estudo… a cobrança retroativa das contribuições.
Interessante observar, a propósito, que a parcela adicional de 1/12 de 13º salário paga em rescisão devido ao aviso prévio indenizado, também de natureza indenizatória e excluída da tributação por meio da alínea “m” do § 9º do art. 214 do RPS continua lá, firme.
Vamos ver como o Judiciário se manifestará sobre os questionamentos que já começam a ser articulados, pois o que o RPS previa no dispositivo revogado era o que chamamos de óbvio trepado no redundante gritando o desnecessário: parcelas indenizatórias são tradicionalmente desoneradas de tributação no mundo todo, e no Brasil não é diferente – pelo menos não até agora, senão vejam-se:
SÚMULA 368 DO TST – DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULO (inciso I alterado) – Res. 138/2005, DJ 23, 24 e 25.11.2005
(…)
EMENTA: Não merece provimento o recurso do INSS que visa executar, nesta Justiça, contribuições previdenciárias referentes a valores pagos no curso da relação de emprego, que era mantida na informalidade e que foi reconhecida pela reclamada, ao firmar acordo, em Juízo, comprometendo-se a efetuar o registro do contrato de trabalho na CTPS do trabalhador, porquanto a competência desta Justiça limita-se à execução das contribuições incidentes sobre o valor das parcelas da natureza salarial pagas por força do acordo homologado. Matéria pacificada pela edição da Súmula 368, item I, do C. TST. Recurso do INSS improvido. Restou consignado, no Termo de Conciliação de fl.17, que o valor do INSS a ser recolhido teria por base de cálculo a importância de R7,36. Dita quantia corresponde aos valores das parcelas relativas às verbas de natureza salarial, discriminadas no acordo. Especificamente, dizem respeito ao 13º salário proporcional (R5,40) e às horas extras (R1,95), que totalizam a importância de R7,35. As demais parcelas discriminadas, quais sejam, aviso prévio indenizado, férias indenizadas e FGTS multa de 40% possuem natureza indenizatória. Consequentemente, não integram a base de cálculo da contribuição previdenciária. Juiz Relator : José Luciano Alexo da Silva. PROC. Nº TRT- 00641-2005-161-06-00-2(RO) – Data 15-02-2006.
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INSS. ACORDO JUDICIAL. INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AVISO PRÉVIO INDENIZADO. PARCELA INDENIZATÓRIA. ININCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
Não há impedimento legal para que as partes transacionem o pagamento apenas de verbas de natureza indenizatória, nas quais não há incidência de contribuição previdenciária. Uma vez que o eg. Tribunal Regional entendeu pelo caráter indenizatório da verba referente a aviso prévio indenizado, não há que se falar em violação dos artigos 28, § 9º, da Lei nº 8.212/91, 487, § 1º, da CLT e 150 § 6º e 195, I, a, da CRFB/88. O Regional negou provimento ao recurso ordinário da autarquia previdenciária, consignando que o fato gerador das contribuições previdenciárias somente ocorre com o pagamento de salário (art. 195, a, da CF), não havendo como atribuir natureza salarial ao aviso prévio indenizado, vez que não é exaustiva a enumeração das parcelas que não integram o salário de contribuição, prevista no artigo 28, § 9º, da Lei 8.212/91, até porque dela não consta, por exemplo, a indenização compensatória de 40% do FGTS, sobre a qual obviamente não incide a contribuição previdenciária e que, igualmente, encontra-se enumerada dentre as parcelas indenizatórias previstas no artigo 214, § 9º, alínea a e d do Decreto 3.048/99, o qual inclui o aviso prévio indenizado nas parcelas não sujeitas à contribuição previdenciária.O agravo de instrumento, portanto, é infértil, nada produzindo. Por tais razões, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do agravo de instrumento e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 28 de fevereiro de 2007. PROC. Nº TST-AIRR-170/2005-066-03-40.7. Relator JUIZ CONVOCADO JOSÉ RONALD C. SOARES. Data 28-02-2007.
Outro problema sobre o qual o Judiciário deverá se manifestar, pois o governo federal não o fez e quando o fizer já sabemos em que direção o fará, é sobre o empregado que não cumpre o aviso prévio, fato que resulta no desconto de seu valor no cálculo da rescisão. O natural é que, nestes casos, o valor descontado continue compondo a base de cálculo da contribuição previdenciária incidente, mas agora negativamente, correto? A observação cabe porque, a exemplo de inúmeras outras complicações adicionadas à legislação tributária, também esta foi feita sem prever todas as conseqüências.
Adicionalmente, comente-se que a Super-receita já vinha tentando exigir a contribuição sobre o aviso prévio indenizado (e sobre o 13º indenizado), por meio de atos normativos como a IN nº 20, de 11/01/2007, tentativa que encontrou a barreira natural da hierarquia de normas.
De qualquer forma, o empregador deve se preparar e tomar as providências para que às despesas decorrentes das demissões não venha se somar também este trambolho tributário.
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