Causa perplexidade ver a estabilidade jurídica, mais uma vez, estremecida por decisão judicial proferida pelas instâncias extraordinárias cujo conteúdo, para piorar a situação, é ampliado pelo rito do art. 543-C do Código de Processo Civil. Foi julgado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 14/10/2009 (e publicado no DJ de 29/10/2009) o Recurso Especial (Resp) nº 1.117.121/SP, cuja relatoria coube à Ministra Eliana Calmon.
Esta decisão, conforme se verá adiante, passou por cima do que diz a Lei Complementar (LC) nº 116/2003 no que diz respeito à competência para exigir o ISS sobre determinados serviços e criou nova regra geral com base num caso concreto, deixando os contribuintes em situação delicada.
TRIBUTÁRIO – ISS – PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – CONSTRUÇÃO CIVIL – PROJETO, ASSESSORAMENTO NA LICITAÇÃO E GERENCIAMENTO DA OBRA CONTRATADA – COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO ONDE SE REALIZOU O SERVIÇO DE CONSTRUÇÃO – CONTRATO ÚNICO SEM DIVISÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS.
1. A competência para cobrança do ISS, sob a égide do DL 406/68 era o do local da prestação do serviço (art. 12), o que foi alterado pela LC 116/2003, quando passou a competência para o local da sede do prestador do serviço (art. 3º).
2. Em se tratando de construção civil, diferentemente, antes ou depois da lei complementar, o imposto é devido no local da construção (art.12, letra “b” do DL 406/68 e art.3º, da LC 116/2003).
3. Mesmo estabeleça o contrato diversas etapas da obra de construção, muitas das quais realizadas fora da obra e em município diverso, onde esteja a sede da prestadora, considera-se a obra como uma universalidade, sem divisão das etapas de execução para efeito de recolhimento do ISS.
4. Discussão de honorários advocatícios prejudicada em razão da inversão dos ônus da sucumbência.
5. Recurso Especial conhecido e provido.
6. Recurso especial decidido sob o rito do art. 543-C do CPC. Adoção das providências previstas no § 7º do art. 543-C do CPC e nos arts. 5º, II e 6º da Resolução STJ nº 8/2008.
A decisão diz que, apesar de a LC nº 116/2003 permitir fracionar e de fato fracionar as várias atividades da construção civil em etapas estanques que podem ser realizadas em municípios diferentes e ter seus impostos recolhidos neles, todo o ISS incidente sobre preços de serviços referentes à obra civil devem ser recolhidos em favor de um único município, que é onde a obra civil for realizada.
O critério criado é no mínimo duvidoso.
Consta na decisão que: “Considera-se a obra como uma universalidade, sem divisão das etapas de execução para efeito de recolhimento de ISS”. Ora, “considera-se” por quê? O critério trai seu caráter francamente pessoal quando vem sem justificativa alguma, não só porque passa por cima do que diz a lei, inovando em matéria tributária sem a competência legislativa para tanto, mas também porque há consideráveis argumentos em sentido contrário. Há obras cujo prazo entre o projeto e a execução final pode consumir anos, envolver contribuintes diversos estabelecidos em municípios diversos e nem ter claro, ao final das etapas prévias à execução da obra propriamente dita, em que município ela ocorrerá.
Ora, não há dúvidas de que o ISS incidente sobre o preço da execução de obras civis é recolhido no município em que está localizada a obra (sempre o foi, desde o Decreto-lei nº 406/68), mas, com base na LC nº 116/2003, o contribuinte que presta os serviços apontados nos itens 7.01 (engenharia, agronomia, agrimensura, arquitetura, geologia, urbanismo, paisagismo e congêneres) e 7.03 (Elaboração de planos diretores, estudos de viabilidade, estudos organizacionais e outros, relacionados com obras e serviços de engenharia; elaboração de anteprojetos, projetos básicos e projetos executivos para trabalhos de engenharia) deve recolher o ISS no Município em que está estabelecido. Este município pode ou não coincidir com o município em que a obra será realizada, e, quer se goste ou não, foi o critério adotado pelo legislador, que não pode ser inovado por decisão judicial.
O fato é que tal decisão criou novo critério de competência para fins de recolhimento de ISS nos serviços de execução de obra civil municiando contribuintes e municípios para litigar em campos opostos, gerando despesas desnecessárias e enorme perda de tempo e energia.
Não é, definitivamente, o tipo de decisão judicial que o contribuinte espera do STJ.
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