Durante muitos anos as incorporadoras imobiliárias amargaram inevitáveis derrotas judiciais na discussão da incidência, totalmente indevida, de ISSQN sobre a atividade. Era certo o encerramento da discussão com a citação de acórdão antigo da primeira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo o qual “não havia dúvida” de que “o construtor também era um empreiteiro” na execução de obra de construção civil em regime de incorporação. Isto porque o STJ considerava que a incorporação era, na verdade, uma mistura de dois tipos de contratos, o de compra e venda e o de empreitada, e, sendo assim, sobre a atividade (empreitada) devia incidir o ISSQN. E este acórdão paradigma ainda citava outros precedentes gerados no próprio STJ; de 1995, o Recurso Especial (REsp) nº 57478/RJ, de relatoria do Ministro Humberto Gomes de Barros; de 1999, o REsp nº 41383/RJ, relatoria do Ministro Antonio de Pádua Ribeiro.
Esta realidade mudou, finalmente, com a solução provida nos Embargos de Divergência em REsp nº 884.778/MT (2006/0267949-8), de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques. Estes Embargos foram opostos por causa de divergências de decisões proferidas em outros julgamentos (REsp 39.735/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro; REsp 10.054/RJ, Rel. Min. Américo Luz, DJ de 6.6.94, por exemplo).
O fato é que muitos municípios argumentavam que as incorporadoras “transformavam a incorporação em contrato de prestação de serviços” quando vendiam os imóveis ainda na planta. A negociação, diziam os municípios, teria o condão de transformar o que é contrato de compra e venda em contrato de prestação de serviços – o que é o que realmente parece, ou seja, um enorme absurdo, mas que encontrou eco nos tribunais até poucos meses atrás.
Ocorre que, das três formas de executar uma obra de construção civil (por empreitada, por administração ou a preço de custo e por contratação direta com o incorporador), apenas as duas primeiras estão previstas na lista de serviços anexa à Lei Complementar (LC) nº 116/2003. A terceira, que é a incorporação imobiliária, tem legislação própria (Lei nº 4.591/64) totalmente alheia ao ISSQN.
A incorporação imobiliária caracteriza-se exatamente pela falta de um contratante de mão de obra, que é o que identifica a execução por empreitada (e subempreitada) e a execução por administração. Ora, se não há contratante e contratado, não há prestação de serviços. São imprescindíveis estes elementos subjetivos. Não há como prestar serviço “para si mesmo”, absurdo que ocorreria na incorporação, que é quando o proprietário do terreno edifica por sua conta e risco as unidades para comercializar.
Destaque textual na decisão:
“Ademais, a lista de serviços sujeitos ao ISS é taxativa, não obstante admita interpretação extensiva. Além disso, é vedada a exigência de tributo não previsto em lei através do emprego da analogia (art. 108, parágrafo único, do CTN). Desse modo, se a previsão legal é apenas em relação à execução de obra de engenharia por administração, por empreitada ou subempreitada, não é possível equiparar a empreitada à incorporação por contratação direta, para fins de incidência do ISS, como entendeu o acórdão embargado.”
O trecho confirma o que sustentamos desde antes da edição da LC nº 116/2003 e sua lista de serviços, quando vigia a lista de serviços anexa ao Decreto-lei nº 406/68: desde que o fato de conteúdo econômico “execução de obras de construção civil” transformou-se em fato gerador de ISSQN, sempre exigiu-se que esta modalidade fosse qualificada pela forma de execução, ou seja, só gerasse a obrigação de pagar ISSQN quando cumprida em regime de administração, empreitada ou subempreitada, justamente para excepcionar a incorporação imobiliária, nascida quatro anos antes da criação do ISSQN e regulamentada pela Lei nº 4.591/64.
Trata-se, sem dúvida, de uma vitória para o contribuinte nacional, acostumado a más notícias.
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