A Constituição Federal de 1988 (CF/88) contempla a proteção ao meio ambiente em seu art. 225, registrando que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações”. Deste dispositivo, depreende-se que cabe ao Poder Público legislar acerca de matéria ambiental e fiscalizar o cumprimento da legislação e, à sociedade, o cumprimento das normas estabelecidas e cobrança do cumprimento dos deveres do poder público.
Para a efetivação deste mister, a própria CF/88 estipula, em seu art. 23 e incisos, que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, assim como preservar as florestas, a fauna e flora, além de determinar que compete concorrentemente aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre questões ambientais, cabendo aos Municípios legislar de forma supletiva.
Deste modo, a União estabelece as normas gerais em questões ambientais e cabe aos Estados – desde que tenham Sistema Estadual de Meio Ambiente (SISEMA) organizado – e aos Municípios (com as respectivas Secretarias e os Conselhos de Meio Ambiente constituídos) disporem, sem infringir as normas gerais da União, sobre as regras que vigorarão em seus respectivos territórios, tais como regras de licenciamento, classificação de infrações, procedimento de fiscalização etc.
Em Minas Gerais, é o Decreto nº 44.309/06 que “estabelece normas para o licenciamento ambiental e a autorização ambiental de funcionamento, tipifica e classifica as infrações às normas de proteção ao meio ambiente e aos recursos hídricos e estabelece o procedimento administrativo de fiscalização e aplicação das penalidades”.
É com espanto que, após tratar no Capítulo V das disposições sobre fiscalização, autuação e procedimento administrativo em matéria ambiental, o decreto trata no Capítulo VI da possibilidade de defesa e de recurso contra aplicação de penalidade, dispondo, em seu artigo 48 que “a defesa ou a interposição de recurso contra penalidade imposta por infração às normas ambientais e de recursos hídricos não terão efeito suspensivo, salvo mediante assinatura de Termo de Compromisso firmado pelo infrator com a SEMAD ou suas entidades vinculadas, obrigando-se o recorrente a eliminar as condições poluidoras e à reparação dos danos eventualmente causados no prazo fixado no Termo de Compromisso”.
Entendemos por inconstitucional esse dispositivo que, não raro, vem sendo copiado nas legislações ambientais municipais.
Ora, exigir o recolhimento da multa aplicada como pressuposto de admissibilidade de defesa ou de recurso contra a aplicação da penalidade que resultou na multa constitui-se em cerceamento de defesa do empreendedor que, eventualmente não dispondo da quantia exigida, não poderá se defender, valendo o que lhe foi imposto unilateralmente pelo Estado.
Em situação bem semelhante, de exigência, por parte do INSS, de depósito prévio, e por parte da Receita Federal, de arrolamento de bens como pressuposto de admissibilidade de recurso, o STF assim se pronunciou, declarando a inconstitucionalidade de tais exigências:
“A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos como condição de admissibilidade de recurso administrativo constitui obstáculo sério (e intransponível, para consideráveis parcelas da população) ao exercício do direito de petição (CF, art. 5º, XXXIV), além de caracterizar ofensa ao princípio do contraditório (CF, art. 5º, LV). A exigência de depósito ou arrolamento prévio de bens e direitos pode converter-se, na prática, em determinadas situações, em supressão do direito de recorrer, constituindo-se, assim, em nítida violação ao princípio da proporcionalidade.” (ADIN nº 1.976/DF, relator Ministro Joaquim Barbosa)
Podemos vislumbrar essa situação se repetindo também no que tange à exigência de recolhimento da multa imposta como pressuposto para apresentação de defesa e recurso contra aplicação de penalidades em matéria ambiental.
Vale ressaltar, ainda, que a legislação acima referida e, por conseqüência, várias legislações municipais, apresenta como alternativa ao recolhimento da multa, a assinatura de “Termo de Compromisso firmado pelo infrator com a SEMAD ou suas entidades vinculadas, obrigando o recorrente a eliminar as condições poluidoras e à reparação dos danos eventualmente causados no prazo fixado no Termo de Compromisso”.
Ora, diante da situação posta, de recolhimento do valor da multa aplicada ou não recebimento da defesa ou recurso, a “opção” de assinatura do referido Termo de Compromisso constitui-se verdadeira coação ao empreendedor e, por vezes, esvazia a própria defesa, fazendo com que o empreendedor se comprometa com ações que desconhece e que, inclusive, podem ser mudadas tendo em vista a defesa ou recurso pendente.
Deste modo, entendemos como questionáveis as exigências acima, cabendo ao empreendedor recorrer ao judiciário para não ter de se submeter a elas.
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