Acordão histórico proferido pelo 4º GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS (TJMG) referente à ação movida pelo SUPERMERCADO MARTINS E FILHOS LTDA. e SUPERMERCADO PARAMINENSE LTDA. encerrou com louvor um longo período de luta de todos os contribuintes mineiros revendedores de mercadorias gravadas pelo regime de substituição tributária de ICMS, que passam a ter, neste julgamento, importante paradigma para solução de feitos similares.
Trata-se de acórdão proferido nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA nº 1.0000.05.427803-1/000(1), impetrado em face do sr. SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA DE MINAS GERAIS, em que foi relator o DESEMBARGADOR BELIZÁRIO DE LACERDA, relator do acórdão o DESEMBARGADOR EDGARD PENNA AMORIN, em julgamento ocorrido em 31/01/2007 e com acórdão publicado em 23/03/2007. Os supermercadistas impetrantes obtiverem o direito de apropriar-se das diferenças de ICMS havidas entre o valor que recolhem a mais, antecipadamente, e o que incide no preço que realmente praticam com os consumidores finais.
A ação garantiu aos supermercados em questão o direito às diferenças dos créditos de ICMS havidos no regime de substituição tributária ao argumento, resumidamente, de que negar-lhes este direito é cegar-se ao enriquecimento ilícito do Estado, que fixa bases de cálculo de ICMS maiores do que os preços que efetivamente praticam com os consumidores finais e, com isto, obriga-os a desembolsar indevidamente parte do valor do imposto.
Em outras palavras, a ação centra-se nas provas de que é o supermercado que desembolsa parte do ICMS da substituição tributária quando o preço pelo qual vende a mercadoria gravada por este regime é menor do que a base de cálculo que serviu para o seu fornecedor reter o imposto. E isto a Constituição Federal não só não admite como ainda prevê o que deve acontecer: o supermercado tem direito de devolução imediata e preferencial da diferença paga a maior no regime de substituição tributária sempre que o fato gerador não ocorrer tal como o Estado presumiu que fosse ocorrer, ou seja, sempre que o preço real praticado na venda for inferior à base de cálculo sobre a qual se recolheu antecipadamente o imposto.
Há muitos anos que os contribuintes mineiros de ICMS, especialmente os supermercadistas, vêm propondo ações judiciais em que provam que estão pagando do próprio bolso imposto que é devido pelo consumidor final das mercadorias que revendem; isto porque o instituto da substituição tributária que grava boa parte das mercadorias hoje em dia vem sendo distorcido pelo fisco mineiro em benefício próprio.
O regime de substituição tributária de ICMS, previsto na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional, é uma técnica de arrecadação em que o imposto é recolhido antecipadamente pelo fornecedor da mercadoria por meio de uma técnica chamada base de cálculo presumida.
Isto significa que o fornecedor (substituto), além do ICMS que deve pela operação própria, embute no preço que cobra de seu comprador o ICMS cujo fato gerador só vai acontecer quando a mercadoria for revendida ao consumidor final pelo supermercadista (substituído). Para isso, o substituto presume o preço que será praticado futuramente pelo substituído e, com base nesta presunção, recolhe o ICMS antecipadamente. Esta técnica diminui muito o trabalho da fiscalização das Secretarias de Estado das Fazendas, encurta os prazos de recolhimento do imposto, evita sonegação, concentra os controles num número menor de contribuintes etc.
O problema, porém, é que a base de cálculo sobre a qual o imposto é recolhido na substituição tributária pelos fornecedores é normalmente maior do que o preço praticado na revenda pelos supermercadistas. Em outras palavras: na hora do verdadeiro fato gerador do ICMS, o preço que o consumidor final paga pela mercadoria revela-se menor do que a base de cálculo sobre a qual o imposto foi recolhido antecipadamente. E esta diferença sai do bolso do supermercadista, que, independentemente do regime do recolhimento do imposto – se débito e crédito ou substituição tributária – tem de ser mero repassador, ao Estado, do imposto que recolhe do consumidor de sua mercadoria ou serviço. Nestes casos em que o recolhimento antecipado é maior do que ele consegue reaver do consumidor, ele deixa de ser repassador para ser contribuinte de fato.
Tudo seria simples se o supermercadista pudesse administrativamente se apropriar do crédito pela diferença que comprovasse haver entre o imposto que pagou antecipadamente e o que ele devia pagar quando finalmente ocorreu o fato gerador, mas o Fisco lhe nega o direito afirmando que “a base de cálculo sobre a qual o imposto foi recolhido é definitiva”, e que ele só teria imposto a reclamar “caso não ocorresse o fato gerador presumido”, ou seja, caso não vendesse a mercadoria.
Proposta a ação, o TJMG reverteu entendimento que vinha sendo repetido ao longo dos últimos anos por apertado placar de 5 x 4, mas não sem antes registrar que não votou o DESEMBARGADOR PINHEIRO LAGO, que aposentou-se antes do julgamento final, e, principalmente, registrar a estupenda reversão do voto do DESEMBARGADOR ISALINO LISBOA.
Mostrando que o apego à coerência muitas vezes é apenas sinônimo de persistência no erro, o DESEMBARGADOR ISALINO LISBÔA, em inspiradíssimo voto e invejável demonstração de ousadia, fez-nos lembrar episódio semelhante de votação de outra matéria envolvendo o ex-ministro do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PAULO BROSSARD, fazendo registrar no acórdão a seguinte observação:
Já havia votado, aliás, em adiantamento, mas, reestudando o caso em si, inclusive, tomando conhecimento dos respeitáveis votos antecedentes, mudo o meu posicionamento para conceder, parcialmente, a segurança, assim como fizeram os eminentes DESEMBARGADORES PRIMEIRO VOGAL e os que o acompanharam, sob o entendimento de que, realmente, a propriedade da via eleita é acertada e, também, pela iminência de lesão quanto à ação do Fisco em tempo futuro.
Assim, reestruturando o meu posicionamento pretérito, rogando respeitosa vênia aos entendimentos em contrário, concedo, também, parcialmente, a segurança.
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