Sustentamos recentemente neste espaço que as empresas de construção civil que se sujeitam ao regime cumulativo de PIS e COFINS podem deixar de recolher estas contribuições sobre a receita obtida com a venda de imóveis, e que seria causa suficiente para propor a discussão judicial o recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento dos Recursos Extraordinários (RE) nºs 357950, 390840, 358273 e 346084. Comentamos que o entendimento final da Suprema Corte para o conceito de “faturamento” é o mesmo defendido pelo imenso mar de contribuintes que levaram a questão da ampliação da base de cálculo destas contribuições ao Judiciário, ou seja, é mais restrito que o que foi estabelecido pela Lei nº 9.718/98, lei que ampliou desmesuradamente o entendimento do termo sem que houvesse à época de sua edição fundamentos constitucionais para tanto.
Este recente posicionamento, defendemos, reacendeu uma antiga discussão no setor imobiliário: é defensável concluir que até hoje a receita obtida com a venda de imóveis pelas construtoras só é tributada de PIS e de COFINS por causa do equivocado entendimento que sempre foi buscado pela Secretaria da Receita Federal (SRF) e que infelizmente acabou sendo aceito pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), de que não faria diferença “para efeitos tributários” o fato de imóveis não serem nem mercadoria nem serviço. Mas este entendimento hoje é evidentemente diferente; a interpretação é mais restrita. O equívoco que vinha sendo cometido é evidente, porque a legislação de PIS e COFINS para quem está no regime cumulativo (ou seja, para quem está sujeito à legislação original de regência destas contribuições, que são as leis complementares nºs 7/70 e 70/91, respectivamente) não admite aquela interpretação extensiva.
Acontece que a estas circunstâncias, que foram um dia suficientes para propor ação judicial discutindo a exigência de PIS e COFINS sobre a receita obtida com a venda de imóveis, somam-se dois fatos novos que são verdadeiras novas causas de pedir: primeiro, a recente transformação do regime jurídico destas contribuições pelas Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 (que instituíram a não cumulatividade para o PIS e a COFINS, respectivamente, que praticamente as transformou em novas contribuições); segundo, o já citado posicionamento do STF no julgamento dos RE nºs 357950, 390840, 358273 e 346084, pois não só o conceito de faturamento foi revisto como sendo mais restrito do que queria a SRF e teria dito o STJ, como também a própria competência para decidir a questão foi estabelecida: trata-se de questão constitucional (e não legal) saber se aquele conceito ampliado pelas leis pode prevalecer ou não. Isto significa que a questão tem de ser decidida, como o foi, pelo STF, não pelo STJ.
O fato é que as construtoras que discutiram a questão anteriormente não tiveram êxito em seus processos, dentre várias razões, porque o STJ, apesar de reconhecer que imóveis não são nem mercadorias nem serviços, firmou entendimento de que “para efeitos tributários” isso não tinha relevância alguma. Hoje, porém, como se vê, evidencia-se relevante, sim, discutir a interpretação e o alcance de conceitos econômicos que pré-existem às tentativas de alcançar novos fatos econômicos e sujeitos passivos. Não é verdade que, “para efeitos tributários”, ora vigore uma interpretação, ora outra, ainda mais variando ao sabor de quem lhes aproveita.
Em resumo, o regime jurídico que vigia à época das proposituras das ações mais antigas já foi bastante modificado, e se é verdade que não existe “direito adquirido a regime jurídico”, também é verdade que isto vale tanto para o contribuinte como para o fisco: da mesma forma com que o fisco não se prende para todo o sempre a uma sentença judicial que dê razão ao contribuinte, bastando que edição de nova lei a respeito do assunto torne necessário o ajuizamento de nova ação para adequar o direito entre as partes à nova realidade jurídica, também o contribuinte não pode se ver eternamente preso a uma sentença judicial que lhe negue um direito quando a situação fático-normativa já mudou de tal modo que lhe permita submeter novamente ao Poder Judiciário a mesma questão, mas sob nova justificativa.
Em resumo, eis o que pode justificar o reajuizamento das ações, entre várias outras razões: (1) já houve a edição da Lei nº 9.718/98, que ampliou o conceito de base de cálculo e majorou a alíquota da COFINS (vale registrar que a questão em tela vem sendo discutida desde antes de novembro de 1997); (2) já se firmou a jurisprudência nascida do julgamento da ampliação da base de cálculo das contribuições operada por esta lei, que firmou o entendimento segundo o qual sob a ordem constitucional em que foi gerada não havia base para a inovação; (3) já foi instituído regime jurídico de apuração totalmente diferente para ambas as contribuições com a edição das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 (a ponto, aliás, de transformá-las praticamente em novas contribuições); (4) o STF é que firmou-se como a instância competente para dirimir a questão – etc.
Ora, diz o parágrafo 2º do art. 301 do CPC que uma ação só é idêntica a outra quando idênticas são as partes, os pedidos e as causas de pedir, em conjunto. Evidentemente que a ação a ser proposta envolverá basicamente as mesmas partes e conterá os mesmos pedidos, mas a causa de pedir no atual panorama jurídico é evidentemente diferente da que motivou as ações anteriormente. Não se trata da mesma coisa.
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